Fernanda Oliveira

Fernanda Oliveira
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quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Dias santos são santos....

Corpus Christi.
Morávamos numa fazenda há três quilômetros de um povoado ribeirinho do Araguaia, norte do estado.
Dia comum, trivial, a não ser pelo jejum comum aos cristãos católicos e suas crendices para dias santos, nosso caso.
Passamos o dia todo em casa, mãe, pai e filhos.
O povoado estava enlutado pelo falecimento de uma jovem de quinze anos naquele mesmo dia. Tumor maligno no cérebro. Por ser parenta de uma tia minha, minha mãe organizou a casa e, no fim do dia, pegaria a estrada estreita e coberta pela mata para prestar seus pêsames à família. Nesse dia, meu pai, como sempre, passou de carranca fechada, mais que o normal. Não falou com ninguém o dia todo, parecia que o demônio havia dominado aquele corpo franzino e surrado, castigado pelo sol escaldante e pelo trabalho na lavoura, por seus esforços, além da comida pobre e simples, que nem sempre trazia muitos nutrientes. 


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Dava pra viver, estamos aqui ainda. Carne? Só duas, três vezes ao mês, quando alguém do povoado matava um boi. Não dava pra quem quisesse.


Era uma vida bem simples, mas que hoje traz um pouco de saudade. As raízes permanecem raízes... Lembro muita coisa, como se fosse hoje. Meu pai cuidava dessa fazenda que era do irmão mais abastado de minha mãe. Na roça, era conhecido como o mais rico dos filhos de minha avó. Ainda é. Está vivo e gordo como um touro. Quando meu pai assumiu a "direção" da fazenda - lembro bem - ele cuidaria dos animais, dos pastos, faria roça pra si e pro meu tio. Assim foi. Ainda receberia míseros quarenta reais como forma de pagamento...Ainda assim eram meio suficientes, já que o salário mínimo da época eram apenas R$ 60,00.  Além disso, a cada quatro bezerros que nascessem, um era nosso. Assim seguíamos. Por ali, num raio de 1 km não havia outro pé de cristão que não fosse o gado no pasto, o cavalo que antes era magrelo e  fraco e agora o pelo brilhava viçoso, cavalo forte e gordo como se fosse de madama, algumas cento e poucas galinhas no terreiro, uma meia dúzia de barrões no chiqueiro, pato, gato, cachorro... Típico. Eu fui o braço direito do meu pai na roça. Filha mais velha, mais crescida e mais forte, consequentemente. Meu pai não podia arcar com despesas, pois tinha ainda que comprar o que não produzíamos: açúcar, café, por vezes o óleo de soja, já que coletávamos o óleo do babaçu (Orrbignya speciosa - palmeira muito comum na região norte do Tocantins, largamente encontrada na região também do Pará e Maranhão. Geralmente está presente nas áreas mais úmidas). 





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Voltando....


Enfim, o velho não dirigiu uma só palavra a um ser vivo durante todo o dia. Se recostava num canto, baixava a cabeça e com um graveto na mão riscava o chão.  O sol se punha aos poucos, escondendo-se por trás das matas que circundavam nossa casa. O silêncio dele incomodava, ma já sabíamos do que se tratava. Sempre. No mínimo, criou alguma situação na cabeça dele e que só existia pra ele. O mundo poderia acabar. Na cabeça dele. De certa forma, víamos isso com um pouco de egoísmo, aliá, ele tinha 4 filhos pequenos pra criar, educar e blá blá blá e o que parecia é que não entendíamos por quê ele queria ficar só no canto dele. A paixão dele era a mata, os bichos, a lavoura, por isso sempre cuidou com muito esmero de tudo isso.  





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Naquele Corpus Christi algo não casava bem, estava fora de órbita, de rumo. Como católicos que somos, em todos os dias santos sempre praticávamos as abstinências de banho, palavras duras, alimentação e trabalhos domésticos, como rezava as ordens da igreja e a tradição da família.  No final da tarde mamãe organizou tudo e meu pai não falara nada até então, sempre de carranca armada. Ela celou o cavalo e quando preparava a saída de casa ele finalmente se moveu, levantou-se do canto que ficara quase o dia todo falou palavrões que feriam a índole da mulher e os princípios daquele dia.  Com uma força fora do normal, os olhos fumegantes e um ódio que dominava todo aquele corpo, ele quase derrubou a parede da frente da casa por conta de uma brusca fechada da porta. A casa, frágil, era edificada com paredes de pau-a-pique,  cobertura feita de talos de palha de coco babaçu, cipó e palhas de babaçu também. 

Coisa que não recordo daquele dia era se minha mãe desistira da ideia de seguir caminho e fazer sala no velório ou se decidira evitar maiores conflitos e ficar em casa. Enfim, passada toda confusão, o dia ainda não estava acabado. As atividades normais só podiam ser praticadas após a meia noite, mas antes disso já estávamos na cama. Muito bico pra pouco milho. A casa que morávamos só tinha um quarto, claro, prioridade do casal. Nossas camas que meu próprio pai havia confeccionado ficavam na sala. Ao lado delas era guardada a velha Monark Barra Circular azul-céu. Luz de lamparina apagada em torno das 9 horas da noite. Eu e minha irmã dormíamos lado a lado em função do pouco espaço na casa. Ainda cochilávamos quando minha irmã ralhou comigo:
- Para, Nanda! Eu quero dormir! 
- Uai, cê tá ficando doida? Eu não mexi em você, já tô quase dormindo! Respondi.
- Então tem alguma coisa aqui!! - apavorou-se.
Minha irmã gritou minha mãe, os dois levantaram e vinham a mãe com uma lamparina acesa e meu pai com a lanterna:
- O que foi, menina? - perguntou meu pai.
- Uma coisa passou na minha perna! - respondeu minha irmã.
Meu pai procurou fervorosamente por algo e quando quase desistia, encontrou, na velha Monark, enrolada da cela até o quadro da bicicleta, uma enorme cobra, há poucos centímetros da minha cama. Naturalmente ele foi morta a pauladas e aquele dia nunca mais saiu da minha cabeça. Pode ter sido uma coincidência, pelo dia, mas até hoje acreditamos que todo o rebuliço criado num dia santo pode ter finalizado nisso: um aviso.
Por isso respeitamo-os com mais fervor (menos eu). Eles  podem se pronunciar nas formas mais inusitadas possíveis. 

Dias santos devem ser respeitados realmente como Santos!


PORTUGUÊIZ

Título proposital, mas que não foge da realidade.
Todos os dias nos deparamos com esse (ou este?) assassinato à língua portuguesa brasileira e na maioria das vezes as pessoas nem sabem disso. Ou pelo menos não se esforçam pra saber, acho que cabe melhor.

Mas aí me vem as perguntas:

Seria isso (ou isto?) uma deficiência na educação brasileira nas escolas?
Seria " a genética do indivíduo"?
A educação do lar?
Interesse próprio?
Desatenção?
Seria a forma de ensino?
Nível de QI?
Muita grana, pouca grana?
Escola pública ou particular influenciam?
Creio que devam existir várias explicações para esta situação, que de tão comum, não hajam tantas preocupações direcionadas.
Sempre estudei em escolas públicas, exceto quando ingressei aos quatro anos de idade e lembro várias coisas... (era feliz e não sabia!) Enfim, não foi no jardim que aprendi a ler e escrever... ali é só uma introdução ao ensino, ou em outras palavras, uma "embromation". Enfim, quero chamar a atenção para o caso a seguir. Tirem suas próprias conclusões. E é verídico  e não resisti em publicar. Alguns dados foram suprimidos para preservar as identidades dos meliantes do assunto em questão.