Fernanda Oliveira

Fernanda Oliveira
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segunda-feira, 13 de maio de 2013

Acabou na pizza

          Fico observando como a vida exterior é dinâmica. Ficamos presos num mundinho micho e tão necessário e lá fora as coisas continuam acontecendo dentro do seu percurso natural. Ou não. Trabalho(s), estudos, diversão, lazer. Caminhos rotineiros, dentro do contexto da mesmice à qual nos submetemos.
          Gosto de relatar coisas - por vezes - simples, porém, interessantes. 

          Dia das mães. Quis quebrar a rotina de minha mãe e minha tia, que está passando uns dias conosco para apoiar minha velha enquanto se recupera de uma cirurgia.   Fizemos o óbvio, mas não pra elas, que nem se permitem a tamanho "luxo". Desde cedo havíamos marcado para irmos ao shopping. Elas precisavam se sentir bonitas para tal. Eu, claro, tive que colocar em ação alguns dos vários dotes autodidatas para tornar isso real. Não podia recusar. Meu íntimo me assombraria a consciência mais tarde. Melhor não deixar de fazer. Transformei-me na designer de sombrancelhas, manicura,  pedicura e arrasadora de pêlos (ou pelos) "buçais". Pronto! Todas lindas e felizes. Passou o almoço. Alguém foi pra cama puxar um ronco. Acordou-se algumas poucas horas depois e eu insisti que fôssemos passear. Meio a contragosto, resistindo como um bichinho selvagem, mammi começou a se arrumar. Nem precisava de tanto, já é linda por natureza!
          Saímos no início da noite e esperamos por mais de meia hora que viesse uma Mercedes Benz com seu devido chofer. Não fosse por alguns momentos de confusão ou lapso (alguns momentos por dia ocorrem, o que não quer dizer exatamente que sou desatenta), olhei errado o horário em que passaria nossa condução.  Adiantamos ou atrasamos  um pouco, revelei.   Mas outro plano entrava em ação. Pegar um táxi quando descêssemos. Chegaríamos ao shopping.  Geralmente meus planos mirabolantes funcionam.
Passeamos pelo shopping (um outro marasmo), lojas fechadas e só o cinema e a praça de alimentação funcionando. Quis muito estar com elas no cinema, mas se recusaram a assistir "A Morte do Demônio" ou "O Último Exorcismo Parte II"... Nem mesmo a  "Somos tão Jovens", que estava mais pertinho! Praça de alimentação era a última jogada. Chopp, suco, pizza, petit-gateau e eu engordando mais dois quilos (amanhã, dobradinha no aeróbico).  Satisfeitas, pizza para viagem e rumamos. Táxi, estação, o mesmo chofer, a mesma Mercedes.  Olhava em um arquivo no celular os horários das  Mercedes e calculava qual compensaria mais em termos de tempo hábil. Nos mantivemos ali mesmo, compensaria a espera de vinte minutos. Vinte minutos intermináveis. Enquanto cabisbaixa e concentrada na pesquisa, um homem se aproximou de minha pizza:
- É pizza isso aí?
- Sim, senhor!! É pizza sim! - respondi.
- Posso comer?
- Pega, meu filho!
         Olhei bem para a cara do sujeito. Maltrapilho. Um boné sobre outro na cabeça, uma camiseta manga curta sobre outra de manga longa. Nas mãos,  uma lata de cerveja e uma garrafa para água mineral cheia de água que não parecia ser mineral, mas também não parecia ser qualquer outro líquido incolor suspeito. Alguns minutos atrás, aquela pizza era  uma grande e bela pizza com dez pedaços, quatro destes antes devorados por três mulheres famintas (só comi um!).
         Voltando ao assunto...
         O jovem maltrapilho apoderou-se da caixa de papelão oitavada, jogou sua tampa em qualquer lugar no chão e não necessariamente degustou o seu conteúdo: engoliu. Ele estava com muita fome, nem devo supor, "estava escrito"!
          Eu não me senti no direito de contrariar aquele pedido tão espontâneo e verdadeiro. Primeiro falou mais alto o meu instinto humano-feminino, depois a rápida conclusão que tirei ao observá-lo. É como você estar sendo assaltado e ser obrigado a não reagir, mesmo contendo o desejo. Foi assim que me senti. E assim ficou.  Uma senhora ainda aproximou-se do rapaz e também o pediu um pedaço de pizza. Ele resistiu um pouco, mas cedeu. Quando parei para observá-la, vi que se tratava de uma dona que me surpreendeu há uma semana atrás em uma outra estação,  enquanto eu me dirigia  ao trabalho, pois virei sua nora e mãe de seus netos e eu tinha até um nome próprio e que eu não sabia, o que me deixou profundamente confusa, pensativa revoltada: "Será que fui trocada na maternidade"?
       Compartilharam aquela pizza que talvez fosse a sua primeira e única refeição do dia. Ele simplesmente limpou o recipiente que trazia a guloseima. Arrotou nojentamente diversas vezes. Parou ao meu lado e ficou me olhando firmemente, o que me fez ficar bem atenta a qualquer reação atípica que ele esboçasse, mas sem encará-lo.
          Finalmente ouvi o tão sonhado ronco do motor e fiz minhas mulheres entrarem primeiro, de modo a deixá-las seguras. Nos acomodamos. Lá fora ouço um barulho de algo pesado tocar bruscamente o chão, seguido de um gemido grave. Ninguém perto. Fiquei apenas chocada, era o que me restava, uma vez que os primeiros metros já estavam sendo percorridos rumo ao nosso destino. E o destino daquele jovem... Bem, eu não sei, mas confesso ter ficado preocupada.
          Tomara que alguém tenha tido o mínimo do bom senso, já que somente por muita sorte uma pessoa instruída em primeiros socorros e/ou com um pouco de humanidade no coração possa tê-lo livrado do pior daquele ataque epilético.

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